São Caetano do Sul,

quinta-feira, 3 de novembro de 2011

Ex-craque da Seleção, Sissi nega ciúmes de Marta: "queria jogar com ela"

 
Foto:Getty Images
 
 
Em uma partida do Campeonato Paulista feminino de futebol de 1997 (intitulado Paulistana), a meia Sissi ficou surpresa ao ouvir a torcida do São Paulo entoando um canto bem humorado que pedia para que a jogadora defendesse também a equipe masculina do clube do Morumbi. A atitude serve como uma mostra do talento que a camisa 10 exibia nos gramados brasileiros em meados da década de 1990, quando representava o principal nome da geração que desbravou o futebol feminino no Brasil.
Em uma comparação: há pouco mais de uma década, Sissi ocupava o lugar que hoje é de Marta no futebol brasileiro. Apesar de não ter sido eleita cinco vezes consecutivas melhor do mundo pela Fifa, como a atual dona da camisa 10 da Seleção, Sisleide do Amor Lima também cravou seu nome na história do esporte nacional.
Dona de grande habilidade e visão de jogo, Sissi era uma meia clássica e fazia jus à camisa 10 que vestia. Comandando um time com jogadoras como a goleira Maravilha, as volantes Márcia Tafarel e Formiga, e as atacantes Pretinha, Kátia Cilene e Roseli, Sissi conseguiu proezas como levar o Brasil ao quarto lugar da Olimpíada de Atlanta, em 1996, e, principalmente, ao terceiro lugar da Copa do Mundo de 1999, quando foi artilheira (com sete gols, ao lado da chinesa Sun Wen) e eleita a segunda melhor jogadora da competição.
Atualmente com 44 anos, Sissi trabalha como treinadora de uma equipe de Junior College (uma alternativa à faculdade) nos Estados Unidos, além de ainda atuar em uma liga amadora, a WPSL, pelo California Storm. Mesmo desanimada com a falta de apoio ao futebol feminino no Brasil, ela mantém o sonho de integrar a comissão técnica da Seleção Brasileira.
Feliz com a história que construiu no futebol como jogadora, Sissi fez questão de, nesta entrevista exclusiva ao Terra, negar qualquer inveja de Marta. Mais do que isso, a ex-jogadora de times como São Paulo, Palmeiras, Saad e Vasco afirmou que uma de suas grandes decepções foi não ter jogado ao lado da estrela. Para o azar do futebol brasileiro, que não pôde ver suas duas maiores jogadoras atuando com a mesma camisa.

Confira a entrevista:

Terra: Na década de 1990 e no início dos anos 2000, você foi a principal jogadora da Seleção, papel hoje ocupado pela meia-atacante Marta. É possível comparar o futebol de Sissi e Marta?
Sissi:
Todo mundo pergunta isso, mas Marta e eu temos estilos diferentes. Às vezes, acontece uma comparação por sermos canhotas e usarmos a camisa 10, mas eu era uma jogadora mais de armação, de visão de jogo, enquanto ela arranca mais com a bola, parte para cima. Mas prefiro nem comparar. Eu cumpri meu papel, fiz o que tinha que fazer pela Seleção. Marquei minha história e, agora, a Marta está fazendo a dela.

Terra: Mas qual sua opinião sobre a Marta?
Sissi:
O povo acha que tem essa questão de ciúme, mas não. Tenho o maior respeito pela Marta e fico feliz por ela ser brasileira. Nos Estados Unidos, o povo admira muito a Marta. Na verdade, lamento por não ter jogado com a Marta. Quando estava no Vasco, ela chegou para as categorias de base. Na época, cheguei a jogar contra ela nos treinos e já era possível perceber que ela era diferenciada. Quem sabe em um amistoso possamos jogar juntas.

Terra: Você acredita que seu nome está entre as maiores jogadores de futebol feminino de todos os tempos?
Sissi:
Pelo que fiz, posso dizer que sim. Meu nome, assim como o da Mia Ham (ex-jogadora dos EUA) e o da Marta, está entre os grandes e ninguém pode questionar. E a tendência é que a cada geração surjam novos nomes.

Terra: Como é sua vida nos Estados Unidos hoje?
Sissi:
Trabalho como técnica do Diablo Futbol Club, onde treino adolescentes de 10 a 18 anos, e do Las Positas, que é um Junior College (uma opção para quem não tem condições de fazer faculdade), em Concord, perto de São Francisco. No Las Positas, trabalho com garotas de 18 a 22 anos. Além disso, ainda jogo a liga amadora (WPSL) pelo California Storm, da cidade de Sacramento.

Terra: Após encerrar a carreira profissional no futebol dos Estados Unidos, você não quis voltar para o Brasil?
Sissi:
Cheguei a voltar para o Brasil em 2006 para jogar no Saad, mas, infelizmente, a situação financeira não estava muito boa. Então, resolvi voltar para os Estados Unidos.

Terra: A sua geração foi pioneira no futebol feminino no Brasil e vocês enfrentaram grandes dificuldades. Quais os principais obstáculos que vocês tiveram que superar?
Sissi:
Desde o começo, mesmo tendo consciência das dificuldades, eu já sabia bem o que queria. Minha geração sofreu muito, ainda mais porque na época havia muito preconceito. Vi muitas jogadoras desistirem. Financeiramente, o que me ajudou foi a vinda para os Estados Unidos. Mas faria tudo novamente. Atualmente, a questão financeira melhorou no futebol feminino brasileiro, mais ainda falta muito apoio.

Terra: Apesar de a Seleção Brasileira feminina ter ficado mais forte e de receber mais apoio, os clubes brasileiros não têm grande visibilidade e não há um campeonato forte. Na sua época, o futebol feminino era mais forte internamente, não?
Sissi:
Na verdade, tivemos grande visibilidade em 1997, quando a Federação Paulista resolveu criar o Paulistana (Campeonato Paulista feminino). Na época, a Federação e a CBF colocaram pressão nos clubes, que tiveram que fazer alguma coisa. Para nós, foi a melhor coisa que poderia ter acontecido, porque o futebol feminino tem que ter apoio.

Terra: Nessa época, inclusive, você liderou o São Paulo na conquista do título paulista de 1997 e chegou a ter seu nome "pedido" pela torcida no time tricolor masculino. Como encarou essa situação?
Sissi:
Nossa, aquilo foi demais, de arrepiar. Até hoje tenho a gravação daquele jogo (em que a torcida do São Paulo pediu Sissi no time masculino). Eu e a Kátia (Cilene, então centroavante do São Paulo) tivemos nosso nome cantado e isso é difícil de explicar. Mas para mim foi um reconhecimento, pois sempre tentei representar o São Paulo da melhor maneira. Foi um dos grandes momentos da minha carreira. Quando começo a lembrar, vejo que realmente tive grandes momentos.

Terra: A Copa do Mundo de 1999, realizada nos Estados Unidos, foi seu auge no futebol (foi artilheira da competição com sete gols, além de levar o Brasil a um inédito terceiro lugar)?
Sissi:
Eu acho que, para o futebol feminino em geral, aquela Copa do Mundo de 1999 abriu portas mundialmente. Tudo saiu perfeitamente, da forma que as americanas planejaram. Aquele Mundial veio no momento certo da minha carreira, coroou tudo que fiz pelo futebol. Foi depois daquela competição que minha carreira profissional decolou, principalmente nos Estados Unidos.

Terra: Antes do Mundial de 1999, porém, a Seleção Brasileira já havia surpreendido na Olimpíada de Atlanta 1996 com o quarto lugar...
Sissi:
Meu sonho sempre foi defender a Seleção Brasileira. Então jogar uma Olimpíada foi um sonho. É difícil descrever a sensação de representar a Seleção de seu país em uma competição dessas.

Terra: Em sua opinião, o que faltou para o Brasil conquistar a inédita Copa do Mundo, em 2011 (foi eliminada nas quartas de final pelos Estados Unidos)?
Sissi:
Não sei como foi a preparação da Seleção Brasileira, mas escutei falar que não foi uma preparação ideal. Já passou da fase de atribuirmos tudo ao fator psicológico. Acho que foi mais a preparação mesmo. Aqui nos Estados Unidos, as americanas se reuniram dois meses antes da Copa do Mundo para se prepararem. Não sei ao certo, mas acho que o Brasil fez poucos amistosos. Acho que faltou um pouco de organização.

Terra: Você acha que o Brasil considerou que a vaga na semi de 2011 já estava garantida e perdeu a concentração (a Seleção vencia até os minutos finais da prorrogação, quando tomou o gol de empate por 2 a 2 e acabou derrotada pelos Estados Unidos nos pênaltis)?
Sissi:
Não sei se chegamos a achar que o jogo já estava ganho. O Brasil teve a chance de não ir para os pênaltis, mas contra os Estados Unidos não se pode vacilar. Infelizmente, não foi dessa vez.

Terra: Acredita que a Seleção Brasileira finalmente pode conquistar o ouro na Olimpíada de 2012, em Londres?
Sissi:
Depende do que estão planejando fazer. Sempre temos esperança, porque talento o Brasil tem de sobra. Mas precisa se organizar. Um país que tem uma Marta deve ter mais consideração por suas jogadoras. Eu, mesmo de longe, fico na torcida pelo Brasil.

Terra: E para o futuro? Pretende continuar trabalhando nos Estados Unidos ?
Sissi:
Meu sonho é treinar uma universidade, fazer parte de uma liga universitária, mesmo que seja como auxiliar no começo. Também tenho o sonho de fazer parte da comissão técnica da Seleção Brasileira. Sei que é difícil, mas se surgir a oportunidade, será ótimo.

Fonte: http://www.terra.com.br/

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